INTRODUÇÃO
A plataformização das notícias é um fenômeno global que se caracteriza pela crescente centralidade das plataformas de redes sociais e mecanismos de busca na produção, distribuição de notícias e no próprio modelo de negócios do jornalismo, incluindo a cadeia de criação de valor dos media (Nielsen & Ganther, 2022). O processo vem transformando os meios jornalísticos em produtores de conteúdos que complementam esses ecossistemas digitais (Poell et al., 2020; van Dijck et al., 2018) em direção à tendencia de publicação plataformizada.
Compreendemos a plataformização como a integração dos conteúdos da Web 2.0 descentralizada, com a criação de um ambiente digital estruturado comercialmente a partir de poucos agentes institucionais. Helmond (2015) descreve a plataformização como o processo de mudança de sites para plataformas, i. e., sistemas de infraestruturas digitais, em que se constroem complementos (i. e. aplicativos) produzidos por desenvolvedores terceiros. O fenômeno marcou a emergência de um novo modelo econômico infraestrutural no ambiente digital, em que os sites de redes sociais (e. g. Facebook, Twitter), buscadores (e. g. Google) e lojas online (e. g. Amazon e Apple) criaram uma dupla lógica de programação que permite a descentralização da produção dos dados (a partir das Interfaces de Programação de Aplicações - APIs) ao mesmo tempo que atua (re)centralizando a coleta de dados dos utilizadores (Gerlitz & Helmond, 2013; Helmond, 2015). Portanto, as plataformas são definidas como agentes intermediários que formam a infraestrutura do ambiente digital.
Definimos plataformas como infraestruturas digitais (re)programáveis que facilitam e moldam interações personalizadas entre usuários finais e complemen- tadores, organizadas por meio de coleta sistemática, processamento algorítmico, monetização e circulação de dados. (Poell et al., 2020, p. 4)
A partir de uma perspectiva crítica, Gillespie (2010) argumenta que o uso do termo “plataforma” ofusca as características dessas infraestruturas digitais. A palavra traz as conotações positivas da criação da Web 2.0, como as características de inovação computacional, liberdade para falar e ser ouvido, e a ideia de igualdade e participação, por possibilitar que o utilizador produza o seu conteúdo e estabeleça a conversação em rede. Mas a analogia ofusca como as infraestruturas computacionais organizam e moldam as interações sociais, económicas, culturais e políticas presentes nelas. Gillespie (2014) também chama a atenção para o problema da falta de transparência dos algoritmos, que estão no núcleo do tratamento massivo de dados e da criação de valor das plataformas.
Assim, as plataformas integram o ambiente informacional e atuam como mercados multilaterais, ao mesmo tempo que recolhem dados, produzem conhecimento e circulam informação em escala global. Nesse sentido, a plataformização é um fenômeno multidimensional, pois possui caráter tecnológico, econômico, cultural e social (Poell et al., 2020).
O contexto do ambiente digital no mundo e em Portugal
As plataformas e a computação móvel promoveram a integração e organização infraestrutural do ambiente digital da web 2.0 (van Dijck & Poell, 2013). Com um ambiente digital marcado pelo uso de telas pessoais para o consumo de notícias, a conectividade constante abre espaço para um novo tipo de rotinização de consumo da informação. Estas são compreendidas como rotinas derivativas, i. e., momentos em que os indivíduos acessam a informação como parte de outras atividades online (Boczkowski, 2021). Nielsen e Ganther (2022) classificam o fenômeno como a mudança de formas de descoberta direta de notícias, -relacionadas aos meios e marcas específicas de jornais, sites ou canais de televisão- para a emergência de uma tendência global de descobertas distribuídas, “onde as pessoas encontram e acessam as notícias via intermediários digitais e serviços de plataformas como mecanismos de buscas, mídias sociais e, cada vez mais, aplicativos de mensagem” (Nielsen & Ganther, 2022, p. 17).
A distribuição plataformizada e a descoberta distribuída de notícias fazem parte das tendências identificadas no Reuters Digital News Report (RDNR) de 2022 (Newman et al., 2022), que apontam para mudanças significativas no ambiente comunicacional ao longo dos últimos cinco anos. O RDNR 2022 indica que a pandemia de COVID-19 acelerou o processo de integração entre os media tradicionais e o ambiente digital, e o smartphone tem se tornado o meio dominante no qual as pessoas acessam as notícias (Newman et. al., 2022).
Mesmo em países em que a TV é o principal meio de informação, os públicos estão migrando para os media online, através dos sites, mecanismos de busca e redes sociais. É o caso de Portugal, em que a televisão ainda é uma fonte relevante de notícias, mas a internet assumiu o protagonismo em 2022, com 76 % de uso para o acesso às notícias, em contraposição a 74 % da TV. Os media impressos apresentaram a maior queda em sete anos (24,8 %); as rádios tiveram um declínio de 7,3 %, saindo de 42,3 % (em 2015) para 35 % em 2022 (Cardoso et al., 2022, p. 69).
O smartphone foi o principal dispositivo de acesso às notícias no país, com 85,1 % e utilização geral e 73 % de utilização para o acesso às notícias em 2022 (Cardoso et al., 2022, pp. 25-26).
Em termos globais, os dados demonstram que, entre 2018 e 2022, o acesso direto aos sites jornalísticos caiu de 32 % para 23 %, e o acesso via redes sociais aumentou de 23 % (2018) para 27 % (2022) (Newman et al., 2022, p. 23).
Nota. De Digital News Report Portugal 2022, por G. Cardoso, M. Paisana e A. Pinto-Martinho, 2022, Obercom, p. 69 (https://obercom.pt/wp-content/uploads/2022/06/DNRPT_2022_FINAL_14Jun.pdf).
Segundo o Digital News Report Portugal (DNR) de 2022, 83 % dos portugueses acessam notícias de forma indireta e apenas 16,4 % vão diretamente aos sites jornalísticos. Os principais meios de acesso são: os mecanismos de buscas (28,2 %), redes sociais (24 %), notificações móveis (14,3 %), e-mail (8,8 %) e agregadores de notícias (6,1 %) (Cardoso et al., 2022, p. 73-74).
O RDNR 2022 aponta que o Facebook perdeu relevância como fonte de notícias ao longo dos anos. Em uma proporção de doze mercados selecionados, a plataforma perdeu 6 pontos percentuais na série histórica que vai de 2014 a 2022. Nos oito anos analisados, houve crescimento do YouTube (de 16 % a 19 %) e do Twitter (de 9 % a 11 %). O TikTok ultrapassou o Snapchat no acesso às notícias (de 1 % em 2020 a 4 % em 2022); e o Instagram teve o maior crescimento, saindo de 2 % (2014) para 12 % (2022) (Newman et. al. 2022, p. 24 ).
O DNR Portugal indica que o Instagram saiu de 2,5 % (2015) para 20 % (2022), um aumento de 17,5 %. O Facebook, em tendencia oposta, saiu de 67,1 % (2015) para 48,7 % (2002) diminuindo o uso para notícias em 18,4 %. O YouTube teve leve queda: sai de 26,4 % (2015) para 24,5 % (2022); e o Twitter permaneceu estagnado, com 7,2 % (em 2015) e 6,9 % (em 2022) (Cardoso et al., 2022, p. 37).
Nota. De Digital News Report Portugal 2022, por G. Cardoso, M. Paisana e A. Pinto-Martinho, 2022, Obercom, p. 26 (https://obercom.pt/wp-content/uploads/2022/06/DNRPT_2022_FINAL_14Jun.pdf)
Nota. De Digital News Report Portugal 2022, por G. Cardoso, M. Paisana e A. Pinto-Martinho, 2022, Obercom, p. 24 (https://obercom.pt/wp-content/uploads/2022/06/DNRPT_2022_FINAL_14Jun.pdf).
Nota. De Digital News Report Portugal 2022, por G. Cardoso, M. Paisana e A. Pinto-Martinho, 2022, Obercom, p. 37 (https://obercom.pt/wp-content/uploads/2022/06/DNRPT_2022_FINAL_14Jun.pdf).
O RDNR 2022 verifica que as notícias em texto ainda são a linguagem dominante, porém, principalmente entre os públicos de 18 a 24 anos, os vídeos e os recursos visuais têm relevância acrescida. Nessa faixa etária, 55 % declararam que leem os textos das notícias, 17 % assistem às notícias em vídeo e 19 % declararam realizar as duas atividades de forma equivalente (Newman et al., 2022, p. 27). Em Portugal, predomina o texto escrito: 66 % declararam somente ler notícias; 10 % principalmente assistem e 16 % realizam as duas atividades (Newman et al., 2022, p. 27).
Portanto, os dados demonstram a emergência do processo de plataformização como um fenômeno profundo no ambiente digital e uma tendência. Dado este contexto, a investigação objetiva cruzar os estudos de caracterização e mapeamento midiático (Negredo et al., 2020; Salaverría, 2017, 2018) e os de plataformização (van Dijck et al., 2018; Poell et al., 2020) para compreender as relações entre os media jornalísticos e as plataformas, a partir do estudo de caso de Portugal.
METODOLOGÍA
Para analisar a ocorrência como o fenômeno da plataformização das notícias no contexto dos media jornalísticos portugueses foram definidas três questões de investigação:
• Q1: Quais meios de comunicação jornalísticos se adaptaram ao ambiente comu-nicacional plataformizado e em quais plataformas estão presentes?
• Q2: Quais são os media jornalísticos que têm maior número de seguidores e publicações e como diferenciá-los em níveis distintos?
• Q3: Quais relações podem ser estabelecidas entre os ambientes próprios de cada plataforma e os media jornalísticos com maiores presenças em cada uma delas?
Elaboramos o desenho metodológico a partir de três etapas distintas e complementares. Para a análise dos dados, foi utilizado o software SPSS Statistics (versão 28.0) e os gráficos foram elaborados utilizando as ferramentas de visualização de dados Infogram e Datawrapper.
Na primeira fase, foi feito o mapeamento e a codificação dos meios jornalísticos, com dados provenientes da Listagem de Registos das Organizações de Comunicação Social (OCS) em funcionamento em Portugal a 2 de fevereiro de 2021 de acordo com a Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC). Esses dados públicos são atualizados mensalmente pela (ERC), que é é responsável pelo registro e regulação das instituições que veiculam o jornalismo em Portugal.
Entre fevereiro e março de 2021, foram coletados 1581 casos de media jornalísticos em Portugal. Deles, 1404 estavam ativos e 1085 estavam presentes nas plataformas, sendo essa a amostra utilizada nesta investigação. Com esses dados elaboramos um livro de codificação baseado nos estudos de mapeamento e caracterização dos media (Salaverría, 2017, 2018; Negredo et al., 2020) e os dados foram codificados entre março e abril de 2021, com as variáveis da tabela abaixo.
As informações da ERC sobre os meios de comunicação em Portugal foram complementadas e validadas com buscas na web feitas para verificar os registros digitais de cada media e se foram atualizados nos últimos três meses. Verificamos também a presença deles no Facebook, Twitter, Instagram e YouTube, e coletamos dados do número de seguidores, publicações e visualizações.
Na segunda fase foi realizada uma classificação que partiu da combinação de dois tipos diferentes de análise de clusters, tal como proposto por Carvalho (2017) e Hair et al. (2009). A amostra tem um tamanho adequado à análise, pois buscamos uma tipologia de casos a partir das variáveis escolhidas. Como aponta Hair et al. (2009), “A amostra deve ser grande o bastante para fornecer suficiente representação de pequenos grupos dentro da população e representar a estrutura inerente”. (p. 439).
Essas técnicas são adequadas para a criação de grupos, dadas as variáveis de natureza quantitativa e os objetivos de compreender a amostra a partir de níveis de presença dos diferentes meios em cada plataforma, i. e., o objetivo de construir uma tipologia de presença plataformizada a partir das medidas empíricas de similaridade dos casos ou medidas de distâncias, conceitos centrais à Análise de Clusters. É esperado que os casos de um grupo sejam semelhantes entre si e diferentes de outros grupos, para observar as relações existentes entre eles, dadas as características de cada media, anteriormente mapeadas e codificadas.
A técnica inicialmente utilizada foi o de clusters hierárquicos com o método de Ward, que organiza o conjunto de dados a partir da distância euclidiana quadrada e define o número de soluções de agrupamentos. Por ser uma técnica de interdependência e sensível às observações atípicas (outliers), os casos extremos foram retirados das amostras e reinseridos nos níveis mais altos de presença nas plataformas. Este procedimento segue a recomendação de Hair et al. (2009), que indica que observações atípicas podem representar “uma sub-amostragem de grupos reais na população que provoca uma representação ruim dos grupos na amostra” (2009, p.439). As observações atípicas foram posteriormente reinseridas nas soluções apresentadas, pois “mesmo que estejam mal representadas na amostra, representam grupos válidos e relevantes” (Hair et al., 2009, p. 439).
Após a identificação do número de grupos a partir do método hierárquico, os grupos foram otimizados com o método não-hierárquico k-médias. Assim, “métodos não-hierárquicos detêm a vantagem de serem capazes de otimizar as soluções pela redesignação de observações até que seja conseguida uma heterogeneidade mínima dentro dos conglomerados” (Hair et al., 2009, p. 471).
Na terceira fase da investigação detectamos e classificamos os três níveis de presença -níveis baixo, médio e alto- e os cruzamos com as variáveis de caracterização. Além da descrição taxonômica, buscamos analisar as relações a partir das variáveis de agrupamento.
RESULTADOS
Caracterização da amostra
Após a codificação, os meios jornalísticos com presença nas plataformas (n = 1085) foram caracterizados como possuindo alcance regional (42, 4 %, n = 460); nacional e internacional (34,2 %), e local (23,4 %, n = 254).
Quanto ao suporte, a maioria é composta por meios impressos (43,9 %, n = 476); online (29,3 %, n = 318); rádio (21,8 %, n = 237); rádios online (2,9 % n = 32) e televisão (2,0 %, n = 22).
Em termos de conteúdo, predominam a informação generalista (70,1 %, n = 761), a informação especializada (27,6 %, n = 299) e a doutrinária, i. e., de orientação religiosa ou política (2,3 %, n = 25).
Quanto à presença nas plataformas, Facebook é a mais utilizada (99,4 %, n = 1078);
seguido do Instagram (44,4 %, n = 482); Twitter (38,2 %, n = 414); e YouTube (34,9 %, n = 379).
Presença dos media jornalísticos no Facebook
Como demonstrado, o Facebook é a rede com maior presença dos media jornalísticos portugueses. É também a mais utilizada no país (com 75,9 % de utilizadores) e a mais usada no consumo de notícias (48,7 %) (Cardoso et al., 2022, p.36).
A tendência às publicações plataformizadas também demonstra uma substituição do site pelas páginas em plataformas, o que ocorreu com 5,1 % da amostra: são meios que não possuem site, mas têm páginas no Facebook.
Os clusters de níveis alto, médio e baixo foram construídos a partir das variáveis de “gostos” (likes) e seguidores (followers) dos media jornalísticos.
Existe um alto nível de concentração entre os grupos com maior número de seguidores e likes nos media jornalísticos portugueses (1,1 % da amostra), em relação aos intermediários (3,4 % da amostra) e aos de nível baixo (95,4 % da amostra). A diferença é mais nítida a partir da análise das médias, desvios-padrão e medianas. O nível alto tem uma média acima de 1,5 milhão de seguidores por página; enquanto o nível médio se aproxima dos 500 000 seguidores. Mas a maior parte dos media estão no nível baixo, com uma média próxima de 21 000 e mediana de 7699 seguidores.
O nível alto de presença no Facebook tem alcance nacional e internacional e é formado pelos meios provenientes da televisão (41,7 %, n = 5); impresso (33,3 %, n = 4), rádio (18,9 %, n = 2) e online (21,6 %, n = 1). Predomina a informação generalista (75 %, n = 9).
O nível médio é diverso, formado por meios jornalísticos de alcance nacional e internacional (83,8 %), mas distribuídos entre media impresso (37,8 %); online e televisão (21,6 %) e rádio (18,9 %). Há equilíbrio entre o conteúdo especializado (56,8 %) e o generalista (43,2 %).
O nível baixo tem mais casos (n = 1029) distribuídos entre o alcance regional (44,3 %), nacional (31,4 %) e local (24,3 %). Estão presentes impressos (44,1 %), online (29,7 %) e rádio (22,2 %), e é predominantemente generalista (72,1 %). Todas as rádios online e os media doutrinários estão nesse grupo.
Quanto ao escopo do conteúdo, o nível alto é generalista (75 %, n = 9), mas também tem conteúdos específicos de informação (16,7 %, n = 2) e de futebol (8,3 %, n = 1).
O nível médio tem mais informação especializada (56,8 %, n = 21), com meios voltados para economia e negócios (13,5 %, n = 5), conteúdos culturais (10,8 %, n = 4), futebol (8,1 %, n = 3), entretenimento/lifestyle (8,1 %, n = 3), específicos de informação (5,4 %, n = 2) e conteúdos de moda, automóveis e arquitetura e design (2,7 %, n = 1).
O nível baixo é amplamente generalista, mas tem diversidade nos conteúdos especializados (27,9 %, n = 271), com destaque para os especializados em cultura (5,1 %, n = 52), religião (3,3 %, n = 34), lifestyle (3,0 %, n = 31), automóveis e caminhões (21, %, n = 22), e imobiliário (1,6 %, n = 16).
Presença dos media jornalísticos no Instagram
O Instagram é a quarta plataforma em termos de utilização em Portugal (53 %) e também a quarta mais utilizada para o consumo de notícias (20 %), atrás do WhatsApp, YouTube e Facebook (Cardoso et al., 2022, p. 36). No entanto, é a segunda plataforma em termos de presença das marcas jornalísticas portuguesas (44,4 %, n = 482).
Os clusters de nível alto, médio e baixo foram construídos a partir das variáveis de seguidores (followers) e publicações (posts). Os media de nível mais alto de presença representam 1,7 % da amostra (n = 8), com dois outliers que foram incorporados nesse grupo, as Rádios Comercial e RFM. Os de nível médio são 2,3 % da amostra (n = 11) e os de nível baixo representam a maioria da amostra (95,4 %, n = 460), com um caso extremo com muitas publicações, mas baixo número de seguidores.
O nível alto tem uma média de 464 086,9 de seguidores e 8889,6 publicações, o que indica a incorporação da plataforma nas rotinas produtivas. No nível médio, são 177 749,1 seguidores e 4438,2 publicações, indicando também o uso regular da plataforma. Já o nível baixo tem uma média de 824,9 publicações e 6150,4 seguidores, o que indica que esses media publicam pouco e têm poucos seguidores.
No nível alto os media vêm principalmente da televisão (37,5 %), rádio e impresso (25 %), e online (12,5 %); tem alcance nacional e são generalistas (62,5 %), e especializados (37,5 %). O nível médio também tem alcance nacional, e vem principalmente do impresso (54,5 %) da televisão e do online (18,2 %, respectivamente). São divididos entre conteúdo especializado (54,5 %) e generalista (45,5 %). O nível baixo é generalista (64,1 %), provenientes do impresso (39,8 %) e do online (37,6 %) e de alcance nacional (42,6 %) e regional (39,8 %).
O escopo do conteúdo indica a predominância da informação generalista no nível alto, mas também existem media especializados em futebol, moda e beleza e os específicos de informação (12,5 %, n = 1, respectivamente). No nível médio, estão os que abordam o lifestyle e celebridades (27,3 %, n = 3), o desporto, a informação e a cultura (9,1 %, n = 1, respectivamente). No nível baixo, os casos mais frequentes são os media que abordam conteúdos culturais (6,7 %, n = 31), lifestyle (5,4 %, n = 25), economia e negócios (3 %, n = 14), automóveis e motos (2,8 %, n = 13) e religião (2,2 %, n = 10).
Presença dos media jornalísticos no Twitter
Segundo o DNR Portugal 2022, o Twitter é a oitava plataforma mais usada pelos portugueses (14,6 %) e a sexta usada para o consumo de notícias (6,9 %), ficando atrás do Facebook, YouTube, Instagram, WhatsApp e Facebook Messenger (Cardoso et al., 2022, p. 36).
Os níveis de presença no Twitter (38,2 %, n = 414) foram medidos a partir do número de seguidores (followers) e publicações (posts). O Twitter é marcado pela presença jornalística, e o nível alto tem os jornais de referência em Portugal (1,7 %, n = 8), como o Público e a Sic Notícias.
O nível médio também traz marcas jornalísticas relevantes ao cenário português, como Record (especializado em desporto) e a RTP 3 (TV All News). Este nível representa 3,9 % da amostra (n = 16). Os demais meios, que estão no Twitter no nível baixo, representam a maioria (94,2 %, n = 390) e são diversas.
O nível alto tem em média 247 537,5 publicações, com 570 430,6 seguidores. No nível médio, são 178 862,5 publicações e 222 982,1 seguidores. Estas médias de publicações indicam incorporação do Twitter no trabalho de distribuição de conteúdo. No nível mais baixo, a média é de 15 849,3 publicações e 2162,9 seguidores.
O nível alto é formado por media de alcance nacional, provenientes da televisão e impresso, e conteúdo generalista (75 %). No nível médio, também predomina o alcance nacional (93,8 %), com meios impressos (37,5 %), da televisão (25 %) rádio e online (18,8 % cada), e o grupo é divido em conteúdo generalista e especializado. O nível baixo tem médias de alcance regional (43,1 %), nacional (41,5 %) e local (15,4 %), com predomínio da informação generalista (68,7 %), do online (44,4 %) e impresso (35,9 %).
No nível alto predominam os meios que veiculam informação generalista, mas estão presentes a informação especializada em futebol e os All News (25 %, n = 1, respectivamente). No nível médio há um aumento dos media especializados em informação (18,8 %, n = 3), futebol (12,5 %, n = 2), economia e negócios (12,5 %, n = 2), cultura e desporto generalista (6,3 %, n = 1 cada). No nível baixo, a informação generalista predomina, mas com casos de media que abordam conteúdos culturais (5,4 %, n = 21), lifestyle/celebridades (3,8 %, n = 12), religião (2,5 %, n = 10), e imobiliário e construção (2,3 %, n = 9).
Presença dos media jornalísticos no YouTube
O YouTube é a segunda plataforma mais utilizada em Portugal (67,7 % de uso geral) e a segunda em termos de consumo de notícias (24,5 %) estando à frente do Instagram e dos aplicativos de mensagens WhatsApp e Facebook Messenger (Cardoso et al., 2022, p. 36).
No entanto, o YouTube é a plataforma que tem a mais baixa presença dos media jornalísticos (34,9 %, n = 379). Os clusters demonstram que o YouTube é mais usado pelas televisões, pois dois casos extremos são a TVI e a RTP, duas TVs generalistas de Portugal. Ambos foram incluídos no nível alto, que é composto por 7 casos (1,8 % da amostra). O nível médio tem 9 casos (2,9 % da amostra) e o nível baixo tem 362 casos (95,5 % da amostra).
O cluster de nível alto do YouTube tem uma média de 308 885,7 seguidores e 239 298 643 visualizações; o nível médio tem 45 505,6 seguidores e 13 725 678,3 visualizações; e o nível baixo tem 1422 seguidores e 370 962,4 visualizações
Quanto à caracterização, o nível alto traz meios de alcance nacional (85,7 %), com destaque para as televisões (42,9 %) e rádios (42,9 %). O conteúdo é dividido entre generalista (57,1 %) e especializado (42,9 %) principalmente das rádios musicais e de entretenimento, que também veiculam jornalismo na sua programação.
No nível médio, os media são de alcance nacional, com conteúdo especializado (55,6 %), e online (55,6 %). O nível baixo tem média de alcance regional (46,7 %), informação generalista (72,9 %), online (42,8 %) e impresso (38,1 %), ou seja, os media regionais utilizam muito o YouTube para a difusão do conteúdo visual
Em termos de conteúdo, no nível alto predomina a informação generalista, e a informação especializada provem das rádios de entretenimento e música (28,6 %, n = 2) e All News (14,2 %, n = 1). No nível médio, também a informação generalista é maior, mas com destaque para os meios ligados ao futebol (22,2 %, n = 2), lifestyle/celebridades, games e automóveis (11,1 %, n = 1, respectivamente). No nível baixo, a informação generalista predomina, e os casos mais frequentes de media especializados abordam conteúdos de cultura e religião (3,9 %, n = 14, respectivamente); lifestyle/celebridades (3,4 %, n = 11); e automóveis, motas e caminhões (2,2 %, n = 8).
DISCUSSÃO
Ao analisarmos o universo dos media jornalísticos com presença nas plataformas em Portugal, os dados demonstram a extrema desigualdade no processo de apropriação dessas infraestruturas digitais, em que os níveis médio e alto representam uma parcela pequena frente ao total.
No Facebook, os dois conjuntos superiores de níveis de presença têm 49 media jornalísticos, que concentram a maior parte de seguidores e likes na plataforma. No Instagram, esses níveis têm 19 meios de comunicação. No Twitter, são 24 media jornalísticos; e no YouTube 16 meios têm a maior parte dos seguidores e visualizações.
Em primeiro lugar, a análise multiplataforma permite identificar que o “alcance nacional” é um fator relevante para a análise e os estudos de plataformização em Portugal, pois tem os maiores valores em termos de seguidores, publicações e visualizações, sendo uma variável que deve ser considerada no momento de escolha de amostras em estudos futuros sobre a plataformização do jornalismo.
Em segundo lugar, os resultados demonstram que a variável “meio de origem” tem relevância nas diversas plataformas, com predominância da televisão e do rádio no Facebook, YouTube e Instagram, com variabilidade no Twitter, em que os meios impressos têm o mesmo peso que os televisivos nos níveis alto e médio.
Em terceiro lugar, existe certo “espelhamento” entre os media mais consumidos em Portugal e a presença deles nas plataformas, e esse processo é mais nítido no Facebook. No entanto, para futuras análises de plataformização do jornalismo, é preciso estar atento às “logicas midiáticas” das plataformas (van Dijck & Poell, 2013), pois há variabilidade em relação aos tipos de conteúdo que os públicos esperam consumir em cada uma delas, e as formas como os media se adaptam a estas infraestruturas. A compreensão da lógica mediática funciona como um esquema interpretativo que permite aos públicos identificar, participar e dar sentido ao processo comunicacional nos diferentes ambientes midiáticos (Altheide, 2015).
No Facebook, as audiências apontam que a plataforma é uma miscelânea de temas e um ambiente impessoal, como um shopping center, “um lugar para passar o tempo procurando amigos e eventualmente também consumir notícias” (Boczkowski, 2021, p. 68). No Facebook, há a maior adaptação dos media portugueses, com destaque para as marcas generalistas conhecidas das audiências.
O Instagram é percebido como um ambiente personalizado e baseado na visualidade. Trata-se da plataforma que mais cresceu em Portugal, entre 2014 e 2022, e os media jornalísticos presentes nela acompanharam esse aumento no consumo de conteúdo informativo, com destaque para a adaptação do conteúdo das rádios nacionais e as revistas especializadas em lifestyle, entretenimento e celebridades. É onde “as pessoas publicam conteúdos com menos frequência, e mais cuidadosamente editados, fotos e vídeos; onde seguem relatos de celebridades e compartilham um pouco de conteúdo frívolo”. (Boczkowski, 2021, p. 72,tradução nossa).
Por outro lado, o Twitter é como “uma banca de jornais, um local para se atualizar das notícias do dia, com uma dose de humor” (Boczkowski, 2021, p. 76). Prevalece um conteúdo breve e voltado para a informação, em um ambiente que gira em torno da informação e das notícias. Os media que estão nos níveis mais altos de seguidores e publicações têm perfil ligado às notícias, esporte e economia, com o uso do texto e dos links informativos.
O YouTube é utilizado como uma ferramenta para vídeos longos, de característica explicativa e alternativa (Newman et al., 2022). Apesar do crescimento do consumo de conteúdo informativo no YouTube em Portugal, os dados demonstram que se trata de uma plataforma em que as marcas jornalísticas têm baixa presença, e é fortemente dominado pelas TVs e rádios nacionais: as rádios o utilizam para transmissões ao vivo de programas e entrevistas, e as TVs utilizam fortemente como repositório de vídeos. Destacam-se também os atores especializados (e. g. revistas sobre automóveis e sobre games) que usam vídeos longos e explicativos para seus nichos de audiência.
CONCLUSÕES
O deslocamento dos media jornalísticos para as plataformas é uma tendência consistente e crescente. O papel dos media jornalísticos, nesse processo, põe questões sobre a legitimidade do conhecimento, valores públicos e quem tem autoridade para produzir e distribuir notícias nesses ambientes informacionais (Ekström & Westlund, 2019, p. 267).
O cenário dos media demonstra uma queda no acesso direto da informação produzida pelas marcas jornalísticas principais e no aumento do poder das plataformas, em uma relação simbiótica que deve ser avaliada não apenas de forma imediata, mas também no longo prazo, já que se trata do futuro do jornalismo no ambiente digital.
O poder da plataforma é uma forma gerativa de poder exercido através de sistemas sociotécnicos construídos por companhias que atraem diversos parceiros tercei- rizados, capacitando-os a fazer coisas que cada um deles valoriza e deseja, e no processo os leva a tornar-se cada vez mais dependentes da plataforma em questão, e cada vez mais entrelaçados em relações altamente assimétricas. (Nielsen & Ganther, 2022, pp. 1-2)
Podemos concluir que a plataformização das notícias reflete parte da distribuição dos media em Portugal, com altos níveis de concentração nos media de alcance nacional que tem como suporte inicial a TV e o rádio, mas também dos que vem do suporte impresso e, em menor proporção, do online.
O aumento do consumo de informação nas plataformas também é uma forma de consumir os conteúdos das marcas já reconhecidas pelos públicos, em um processo que tem mais estabilidade e continuidade do que mudança e inovação. As grandes marcas nacionais utilizam a distribuição plataformizada de notícias para se consolidar nesses ambientes, garantindo visibilidade e fidelização dos públicos. A presente investigação se aproxima dos achados anteriores (Newman et al., 2022; Cardoso, et al., 2022), que demonstram que a plataformização tem aumentado a dependência dos meios em relação às redes sociais e mecanismos de buscas no processo de descoberta distribuída de notícias (Nielsen & Fletcher, 2022).
No entanto, os estudos futuros sobre plataformização do jornalismo devem levar em consideração a variabilidade das lógicas das plataformas, pois atores institucionais de menor visibilidade nacional e públicos de nicho têm um destaque acrescido em plataformas como o Instagram e o YouTube.
Assim, a análise por agregação no número de seguidores, publicações e visualizações é relevante para perceber como as audiências reconhecem, identificam e seguem esses conteúdos, a partir das lógicas das plataformas, e se apropriam de forma complexa de suas gramáticas comunicacionais.
Este método é útil para evitar vieses amostrais em estudos futuros sobre os media nas plataformas, compreendendo que, neste universo, existem três grandes grupos em cada rede e de que nível fazem parte os casos escolhidos para estudo, assim como sua representatividade face ao total. A investigação também buscou contribuir, a partir de uma perspectiva do universo dos media, à percepção de como eles se posicionam nas plataformas. É perceptível que apenas parte do universo se apropriou de redes como o Instagram, e que os tipos de presença diferem bastante de acordo com a plataforma.
A análise das dependências dos media em relação às redes sociais e mecanismos de buscas se coloca como uma linha futura de investigação, para complementar a compreensão do ecossistema de notícias em Portugal. Além disso, em um contexto de ascensão do consumo de informação por vídeos, principalmente entre os mais jovens, torna-se relevante compreender o papel do TikTok nesse ecossistema, indicando a necessidade de pesquisa sobre a presença e os usos que os media fazem desta plataforma, com suas possibilidades e constrangimentos.
Outra questão relevante para a investigação são as estratégias de contrabalan- ceamento frente às plataformas (Steensen & Westlund, 2020), i. e., como os media estão criando estratégias para minimizar esta dependência, pensando na sustentabilidade dessa relação em processos de média e longa duração.
Assim, concluímos que a plataformização é um fenômeno relevante ao ecossistema de notícias em Portugal, com integração significativa dos media jornalísticos a estas infraestruturas digitais que, ao mesmo tempo que auxiliam a conexão com o usuário e aumentam o alcance aos diversos públicos, também controlam os dados e grande parte da publicidade, operando em uma lógica de aumento da dependência.